A iminente queda de uma facção que vem sendo vencida diariamente pela sede do poder
Uma lealdade que perdurou por 13 anos chegou ao fim por um motivo óbvio e comum entre facções criminosas estabelecidas em quase todo o território nacional. O grupo criminoso que aterrorizou o Estado na primeira década dos anos 2000 agora vê sinais de um fim iminente e já esperado.
No princípio, a parceria entre o Comando Vermelho, facção do Rio de Janeiro, e o Sindicato do RN era baseada em total confiança. O grupo recém-formado no Rio Grande do Norte precisava de apoio logístico, armas, dinheiro e treinamento. O CV não negou ajuda, já vislumbrando um futuro lucrativo para uma das maiores organizações criminosas da América Latina. Enquanto o Primeiro Comando da Capital (PCC) abria caminho rumo à Europa com cocaína, o CV buscava a mesma droga na Colômbia, México e Guatemala para distribuí-la no Brasil. O produto precisava ser espalhado e, como uma empresa de altos investimentos, o Nordeste brasileiro era a “menina dos olhos”, oferecendo baixo custo e alta lucratividade.
O problema é que deram asas a cobras, e quem passou a comandar percebeu que o tráfico era uma mina de ouro. Novas rotas e formas de trazer a droga começaram a surgir, constatação que deixou os chefões do Comando Vermelho extremamente insatisfeitos. Sentindo-se traídos, os criminosos apertaram o gatilho. Imediatamente, a facção carioca CVRL (Comando Vermelho Rogério Lemgruber), fundada em 1979 no presídio da Ilha Grande, tomou uma decisão simples e de baixo custo para seus membros: localizar e identificar os líderes de facções que demonstrassem potencial comportamento de traição e executá-los.
A matança vingativa seguiu uma regra simples: se está com o Comando, está tudo certo; senão, é morte. O banho de sangue começou no final de outubro, em Natal, espalhando-se rapidamente pelo interior do Estado. Quem hasteava a bandeira vermelha e manchava, em nome da honra do Comando, as mãos de sangue, assinava o livro da fidelidade com o CV. Já quem insistia em cumprir ordens do Sindicato assinava a própria sentença de morte. Estima-se que mais de 50 pessoas foram mortas nos últimos seis meses, em execuções que ocorrem à luz do dia, em plena movimentação de comércios e pessoas.
Em um dos casos, a vítima tinha apenas 15 anos. Cerca de dez criminosos arrastaram o adolescente para fora da casa onde morava com a família e efetuaram cerca de 30 disparos. O crime ocorreu na zona Oeste de Natal. Uma marca registrada da crueldade e um recado para quem ainda duvida do poder de uma organização criminosa que, há muito tempo, age sem limites quando deseja conquistar territórios e retomar o que perdeu pelas mãos de antigos aliados.
O PortalBO conversou com o especialista em Segurança Pública Ricardo Pauzzelini Bruno, do Instituto Nacional de Estudos sobre a Migração do Tráfico no Crime no Brasil. Pauzzelini informou que as duas maiores organizações criminosas do país atuam de maneiras distintas quando o assunto é tráfico de drogas: “Os estudos apontam que o PCC está voltado ao narcotráfico de cocaína, utilizando principalmente portos como os de Natal, Recife e Santos, uma atividade ilícita fortemente fiscalizada pela Receita Federal e pela Polícia Federal. Já o Comando Vermelho prefere manter-se no território nacional, estimulando pequenos traficantes e provocando disputas diárias. Mas, enquanto houver corrupção, esses transportes continuarão — ora em grande escala, ora em menor”, destacou.
Estima-se que, devido a esses conflitos que apenas começaram, dezenas de pessoas ainda possam morrer nos próximos meses, dificultando o trabalho da Polícia Civil, que acumula inquéritos praticamente sem solução. As investigações até começam com o relatório circunstanciado no local do crime, mas não prosperam. O elemento mais importante para o andamento do inquérito acaba amordaçado, silenciado temporariamente — ou para sempre.